FEIJÓ: Shane Kaya – Um povoado em busca de suas raízes
Existe um povo nos arredores do
município de Feijó, distante aproximadamente 364 km da capital Rio
Branco, que vive um tempo de resgate cultural, construção e
sustentabilidade.
Estes são os Shanenawas, uma etnia que
viveu a mesma história de muitas outras no estado do Acre, graças a
rápida ocupação da Amazônia em função do extrativismo e exploração do
caucho. Eram utilizados para o fornecimento de mão de obra e insumos
para os seringueiros na região.
Além disso, os Shanenawas “fugiram” da
sua região de origem, o rio Gregório, por conta de conflitos com o povo
Yawanawa, o que fez com que eles migrassem pra região do rio Envira e
assumissem a identidade dos Katukina a fim de se “camuflarem” e não se
indisporem com os Yawanawa mais uma vez. Porém ao longo dos anos, os
Shanenawa foram reafirmando sua identidade original.
Hoje este povo vive um novo tempo de
lembranças, preservação do meio ambiente e resgate de sua cultura. O
cacique Nay Nawá saiu das proximidades do centro de Feijó, e percorreu
sete quilômetros da BR 364 em direção a Cruzeiro do Sul, e entrou numa
área de floresta, que segundo ele, que é agente ambiental, “era apenas
floresta secundária”, e junto com sua família, começaram um novo
desafio: criar uma nova aldeia.
E foi assim, com facões e instrumentos
comuns, abriram uma picada na mata, e em 2014 fixaram morada onde hoje é
o povoado Shane Kaya, um lugar com igarapés, grandes morros, e de muita
fertilidade.
Celebração cultural
Desde 2015 os Shanenawas mobilizam toda a aldeia para realização de uma grande festa no terreiro. Amãytí Mãnã Runukeneya é a frase que recebe quem visita o grande terreiro de chão batido, que em tradução livre significa “terreiro da jiboia colorida”. A jiboia é considerada um animal sagrado para várias comunidades indígenas.Aqui não entram comidas artificiais, bebidas, e tudo o que consumimos é produzido aqui. Temos sustentabilidade na produção de frutas, verduras e queremos ter uma vida saudável que proporciona a longevidade de nossos antepassados
Nay Nawá
O Cacique enquanto dizia isso, segurava um tubérculo chamado “Niá
Yuxu”, que significa “Batata em pé”, e se parece muito com a mandioca,
se come cru, tem um leve sabor adocicado, porém, segundo ele, ninguém
preservou a cultura deste alimento, e apenas ele possui uma plantação,
que é guardada a “sete chaves”.No almoço, mingau de banana, farinha,
verduras, e peixe feito exatamente como os índios faziam antes de usarem
panelas. Cozido no interior da taboca, ou bambu e, às vezes, na folha
da bananeira, este feitio, ou prato se chama “Kawa“. Ele reafirma:
“tentamos fazer um resgate em cada detalhe, desde a língua que vinha
sendo perdida, até na maneira de cozinhar”.
Após a pausa para o almoço, voltamos para Manã Runukeneya, o
terreiro que não para um segundo sequer durante esse dia de festa.Mais
música, mais dança e tudo regado ao “Matxu”, mais conhecido como
caiçuma, uma bebida fermentada feita da mandioca produzida ali mesmo,
por eles, e que é acondicionada num tronco de palmeira, para que quem
estiver ali se sirva à vontade.
Festa e espiritualidade
Cai a noite e os Shanenawas e
convidados continuam a festa até o amanhecer, porém com um ritmo mais
lento, para a comunhão dos participantes em volta da fogueira em um
lindo ritual Ayahuasqueiro, onde a música e o colorido do bailado dos
homens, mulheres e crianças ali presentes deixam a noite mais iluminada,
e bordada com estrelas.“Shava shava!” é o grito de celebração, uma
expressão usada para celebrar, como “Haux Haux!” É como dizer “Viva!” em
nossa língua.Como a festa não parou até as oito horas da manhã
seguinte, foi possível ver o encontro da noite com o dia, onde as
estrelas insistiam em permanecer até o último minuto antes de se
despedir, assim como eu, que demorei a dizer “tchau” pra todos os novos
“txais” e amigos que conheci neste lindo encontro.
Aecom/Acre
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